Pesquisador afirma que Brasil investe “até demais no combate à Aids”
08/06/2011
O último domingo, dia 5, marcou o 30º aniversário do primeiro relato científico sobre pessoas contaminadas pelo HIV. O trabalho analisava o caso de cinco homens jovens e aparentemente saudáveis que tiveram pneumonia – dois deles haviam morrido, quando a deficiência imunológica por eles apresentada viria a ser conhecida mundialmente como Aids (sigla de Sida – Síndrome da Imunodeficiência adquirida – em português).
Três décadas depois o Brasil pode se orgulhar de ter adotado o melhor programa público contra a Aids no mundo, na visão do cientista político Eduardo Gómez, da Universidade Rutgers, nos EUA.
O pesquisador fez uma pesquisa comparando as políticas de Brasil e EUA para doenças com as quais os investimentos públicos podem eventualmente não ser bem vistos por determinados setores da sociedade como Aids, sífilis e obesidade, entre outras.
Gómez aponta que, desde o início – nos anos de 1980, o Governo, as organizações e as comunidades de portadores de HIV agiram de forma mais integrada no Brasil que nos EUA. “As comunidades de Aids em San Francisco e Nova York não se comunicavam. Quando a Aids apareceu nos EUA, houve muita discriminação. No Brasil também houve, mas o Governo foi mais receptivo”, afirma.
O fato do país – na época – estar saindo do governo militar, bem como aprovar a Constituição de 1988, que menciona que a saúde é “direito de todos e dever do Estado”, contribuíram para o forte investimento em um programa de combate à doença.
Já nos EUA, o ambiente mais conservador sob os presidentes Ronald Reagan e George Bush prejudicaram a adoção de medidas nacionais e agressivas. Grupos religiosos influentes, aponta Gómez, defendiam a ideia de que a Aids era um castigo divino aos gays. “O Brasil sempre foi mais aberto ao tratamento de doenças sexualmente transmissíveis”, fala.
Ainda, conforme o estudioso, a pressão da comunidade internacional foi outro fator que fez com que o Brasil investisse em um programa contra a Aids. “Conversei algumas vezes com o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso e ele era muito preocupado com isso. Queria mostrar que o país estava preparado para fazer frente à doença”, completa Gómez.
O resultado foi que atualmente o Brasil oferece medicamentos gratuitamente a todos os infectados, enquanto que nos EUA há mais de 8 mil pessoas esperando para receber remédios. Hoje países africanos – os mais atingidos pelo HIV, tentam replicar a iniciativa brasileira, mas lutam contra a falta de recursos.
EXCESSO DE PRIORIDADE
Apesar de destacar o programa brasileiro para a Aids como algo positivo, Gómez aponta também que a doença no Brasil pode ser considerada “sob controle”, além de seguir tendo um investimento desproporcional em seu combate.
“É uma má ideia gastar muito dinheiro em Aids e esquecer as outras doenças. Há um problema nessa tendência, que acontece em todo o mundo. O único país que não fez isso é a Rússia. Eles decidiram investir em câncer, alcoolismo e problemas mentais”, conta.
“A tuberculose voltou ao Rio de Janeiro e São Paulo, mas não recebe os mesmos recursos que a Aids. O Sistema Único de Saúde (SUS) tem dinheiro limitado e precisa responder a todos esses itens: diabetes, problemas do coração, obesidade”, destaca o pesquisador ao defender que a Presidente Dilma Rousseff deveria ter como maior prioridade de seu Governo um aumento nos recursos para a saúde pública brasileira.